Estudo revela que os momentos de socialização
e afeto com os professores são mais valorizados por jovens infratores
do que o conteúdo em sala de aula
Eles iniciaram os estudos, em média, aos sete anos de idade,
repetiram de série no mínimo duas vezes e têm pais com baixa
escolaridade. Esses adolescentes, entre 15 e 17 anos, não conseguem
estabelecer conexão, nem permanecer, no ambiente escolar. Para eles, a
escola é o lugar para encontrar amigos, e não para aprender. Para a
escola, eles são jovens "problema", com os quais é muito difícil lidar.
Os ex-alunos em questão são jovens infratores entrevistados pela
pesquisadora Aline Fávaro, da Universidade Federal e São Carlos
(UFSCar), para elaboração da dissertação de mestrado O Jovem autor de ato infracional e a educação escolar: significados, desafios e caminhos para a permanência na escola, defendida em fevereiro de 2011.
A partir da questão sobre como esses jovens significam a escola e
suas vivências no ambiente escolar, Aline concluiu que a convivência e
as interações são percebidas como os aspectos mais importantes,
positivos e prioritários para esses adolescentes. Eles também valorizam o
afeto na relação com os professores, reforçando a influência do vínculo
para a aprendizagem.
Os significados do ambiente formal de aprendizagem, porém, podem ser
indícios de uma crise escolar mais aguda: a sala de aula é vista como um
local desinteressante, caracterizada pela pouca interação, pelo
silêncio, pelo encarceramento da espontaneidade, do gesto e do
questionamento. O conteúdo formal é carente de sentido, há dificuldade
de compreensão dos assuntos abordados em sala e falta relação com o
cotidiano. Respostas pertinentes apenas ao universo de jovens
infratores?
"Outros estudos mostram que a juventude em geral não vê nada de
significativo na escola. No caso desses alunos, não podemos falar em
causa e efeito provocado pela evasão e a infração. Temos que considerar
outros fatores, como a violência da comunidade na qual estão inseridos",
diz Aline.
Possibilidades para a escola
Do
outro lado, apesar da sociabilidade ser valorizada por esses jovens, a
escola pouco reconhece as relações e interações como práticas sociais
que envolvem processos educativos legítimos.
"A escola tem dificuldade em lidar com a situação dos alunos. É um
problema estrutural. Os professores podem contribuir, mas a escola tem
que reestruturar conteúdos, encontrar formas de reconhecê-los como
jovens, estar conectada a essa vida, reconhecer outras práticas
educativas", reflete Aline. Segundo ela, os professores reconhecem que
não têm preparo para lidar com esses jovens, mas demonstram interesse em
conhecer mais sobre o tema.
A pesquisadora estudou um universo de 50 jovens, sendo realizadas
seis entrevistas, das quais três adolescentes haviam acabado de sair da
Fundação Casa e aguardavam vagas na rede pública de ensino para voltar
ao ambiente escolar. Segundo Aline, o primeiro momento de empenho é
superado pelo desânimo em decorrência da demora em conseguir uma vaga.
Apenas um dos entrevistados havia alcançado o Ensino Médio, os demais
haviam evadido no Ensino Fundamental.
Psicóloga de formação, Aline, que sempre trabalhou com jovens
infratores, diz que as características comuns a esses jovens são a
dificuldade em lidar com regras, em estabelecer rotinas e em lidar com a
frustração. O envolvimento com drogas também é frequente, afetando a
capacidade de concentração.
"Para a psicologia, o importante é olharmos o indivíduo do ponto de
vista global. Ele não é só o ato infracional que cometeu. O que temos
que perguntar é "o que posso fazer por esse ser humano?", reflete.
O tratamento humanizado defendido pelos atendimentos psicológicos
atuais envolve afetividade e o estabelecimento de vínculos, algo que a
escola também pode criar. "Se olharmos o histórico desse adolescente,
vemos que ocorrem vários pequenos atos antecedentes. Por isso a
importância da formação da escola e do professor para conseguir olhar
esse aluno por outro ângulo".
Texto retirado do site Revista Educação, escrito por Juliana Holanda.
Nenhum comentário:
Postar um comentário